Dois Mil Rostos
Ainda a propósito da viagem ao norte, há dois fins de semana atrás, e dividido sobre o papel deste blogue agora lincado como website de Jorge Cruz no myspace, queria deixar escritas pelo menos 400 palavras.
18 de Janeiro: Tinham-me dito que a FNAC de Coimbra não seria pêra doce. Talvez por ficar no cimo de uma colina do outro lado do Mondego. Talvez por ser sexta-feira e os estudantes estarem de volta às terras-natais. Não sei. Eu que em 15 anos de concertos nunca estivera na cidade para tocar, ia sem expectativas, cheguei atrasado ao soundcheck e arranquei para o concerto meio às apalpadelas para encontrar os pedais e pousar a boca no microfone. A verdade é que a reacção da sala muito bem composta foi calorosa. Acabei por conhecer umas quantas pessoas que já esperavam há uns anos para me ver tocar e os discos foram desaparecendo do expositor. Começava com o pé direito um fim de semana louco e, ainda por cima, a carlsberg estava fresquinha.
Findo o trabalho, segui com o Chris Murphy (tour manager e documentarista de serviço) para o concerto do Old Jerusalem no Salão Brasil. Mais tarde, no Quebra-Costas, passámos uma boa noite a cavaquear com os amigos da Borland e o caríssimo Tiger Man (um dos bandidos do rock português com verdadeiro sangue na veia e boas histórias para contar) enquanto o "santo da casa" Nuno Ávila punha discos. Óptima passagem por Coimbra, onde as recepcionistas de hotel coram com uma facilidade tocante.
19 de Janeiro: Rumo ao Porto: a cidade mágica, a cidade trágica, a cidade nunca vencida. Um dia de sol tão generoso quanto improvável para quem já tenha provado o rigor respeitável dos Invernos no Norte. Só aos republicanos é permitido afirmar que o aquecimento global não é uma verdade empírica. Desta vez, fiz o soundcheck atempadamente na FNAC de Santa Catarina, de modo que aproveitei a hora anterior ao concerto para subir até à Cordoaria e sentar-me na esplanada do Manuel Alves a depenicar uns rojões e a beber um copo de vinho tinto. O Porto parece-se cada vez mais com uma cidade do Norte da Europa. Uma das mais belas, diga-se. As praças são vastas pistas de pedra. Os edifícios desbotados pela chuva. Desperta-me uma imensa nostalgia. Ali passei à volta de 13 anos de vida.
Na FNAC esperam-me velhos amigos, caras conhecidas e outras que nem tanto. Últimamente, quando toco no Porto fico sempre indeciso se aquilo é um concerto ou a minha festa de anos. Toco relaxadamente, como quem sabe que ainda há muito trabalho pela frente nesse dia. É que à noite, nos Maus Hábitos (cimo da rua), é que o povo se vai juntar para a verdadeira festa. De qualquer modo, repete-se uma boa sala em Santa Catarina e uma série de discos vendidos.
Jantamos junto à Praça dos Poveiros com uma data de gente amiga. Entretanto, o Eurico Costa liga para combinarmos se vem tocar uma ou duas músicas. A resposta é claro que sim. Conheci o Eurico por intermédio do André Indiana e acabámos por andar a tocar juntos por todo o lado entre 2004 e 2007. É um guitarrista exímio e um pensador admirável com quem se ditaram 10.000 páginas de bons diálogos que nunca serão transcritos. Chegamos ao bar já bem animados. O staff é impecável e a sala está a aquecer. Quando entro, a festa está começada. Daí para a frente, só me lembro de um mar de gente, de a certa altura o Eurico entrar para tocar um solo de 10 minutos no "Adriana" e eu ficar a dançar ali ao lado, de estar a tocar "Os Demónios de Alcácer Quibir" e não me apetecer que aquilo acabe. De resto, toda a noite foi intensa. O Porto tem personagens que não lembram ao Diabo, nem a Deus, nem ao David Lynch. Muito divertido.
20 de Janeiro: Terminamos a festa na FNAC do Norteshopping, algo combalidos da noite anterior. Arranco com o "Anda Menina" para testar a voz que está meio perdida algures entre o nariz e o esófago. Mas as palavras continuam a ecoar, não sei porquê. Continuam a fazer-me acreditar em algo que já nem sabia que existia. Com o "Canção da Tua Rua" o gig engata, sem volta atrás. A viagem está prestes a terminar e, ainda no palco, já sinto saudades. Há uns abraços, umas fotos e assinaturas no fim, os Peixe:Avião vêm de Braga para falarmos do disco deles que muito promete. Está o grande Ronaldo com a sua voz de anjo sentado a rir-se do que lhes está a acontecer e eu preparo-me para voltar à estrada com a noite a cair e na memória: dois mil rostos ou um, dois mil rostos ou um, dois mil rostos. Ou um.
Obrigado a todos os que apareceram, e à gente do Porto por me receber sempre de braços abertos. Até já.
18 de Janeiro: Tinham-me dito que a FNAC de Coimbra não seria pêra doce. Talvez por ficar no cimo de uma colina do outro lado do Mondego. Talvez por ser sexta-feira e os estudantes estarem de volta às terras-natais. Não sei. Eu que em 15 anos de concertos nunca estivera na cidade para tocar, ia sem expectativas, cheguei atrasado ao soundcheck e arranquei para o concerto meio às apalpadelas para encontrar os pedais e pousar a boca no microfone. A verdade é que a reacção da sala muito bem composta foi calorosa. Acabei por conhecer umas quantas pessoas que já esperavam há uns anos para me ver tocar e os discos foram desaparecendo do expositor. Começava com o pé direito um fim de semana louco e, ainda por cima, a carlsberg estava fresquinha.
Findo o trabalho, segui com o Chris Murphy (tour manager e documentarista de serviço) para o concerto do Old Jerusalem no Salão Brasil. Mais tarde, no Quebra-Costas, passámos uma boa noite a cavaquear com os amigos da Borland e o caríssimo Tiger Man (um dos bandidos do rock português com verdadeiro sangue na veia e boas histórias para contar) enquanto o "santo da casa" Nuno Ávila punha discos. Óptima passagem por Coimbra, onde as recepcionistas de hotel coram com uma facilidade tocante.
19 de Janeiro: Rumo ao Porto: a cidade mágica, a cidade trágica, a cidade nunca vencida. Um dia de sol tão generoso quanto improvável para quem já tenha provado o rigor respeitável dos Invernos no Norte. Só aos republicanos é permitido afirmar que o aquecimento global não é uma verdade empírica. Desta vez, fiz o soundcheck atempadamente na FNAC de Santa Catarina, de modo que aproveitei a hora anterior ao concerto para subir até à Cordoaria e sentar-me na esplanada do Manuel Alves a depenicar uns rojões e a beber um copo de vinho tinto. O Porto parece-se cada vez mais com uma cidade do Norte da Europa. Uma das mais belas, diga-se. As praças são vastas pistas de pedra. Os edifícios desbotados pela chuva. Desperta-me uma imensa nostalgia. Ali passei à volta de 13 anos de vida.
Na FNAC esperam-me velhos amigos, caras conhecidas e outras que nem tanto. Últimamente, quando toco no Porto fico sempre indeciso se aquilo é um concerto ou a minha festa de anos. Toco relaxadamente, como quem sabe que ainda há muito trabalho pela frente nesse dia. É que à noite, nos Maus Hábitos (cimo da rua), é que o povo se vai juntar para a verdadeira festa. De qualquer modo, repete-se uma boa sala em Santa Catarina e uma série de discos vendidos.
Jantamos junto à Praça dos Poveiros com uma data de gente amiga. Entretanto, o Eurico Costa liga para combinarmos se vem tocar uma ou duas músicas. A resposta é claro que sim. Conheci o Eurico por intermédio do André Indiana e acabámos por andar a tocar juntos por todo o lado entre 2004 e 2007. É um guitarrista exímio e um pensador admirável com quem se ditaram 10.000 páginas de bons diálogos que nunca serão transcritos. Chegamos ao bar já bem animados. O staff é impecável e a sala está a aquecer. Quando entro, a festa está começada. Daí para a frente, só me lembro de um mar de gente, de a certa altura o Eurico entrar para tocar um solo de 10 minutos no "Adriana" e eu ficar a dançar ali ao lado, de estar a tocar "Os Demónios de Alcácer Quibir" e não me apetecer que aquilo acabe. De resto, toda a noite foi intensa. O Porto tem personagens que não lembram ao Diabo, nem a Deus, nem ao David Lynch. Muito divertido.
20 de Janeiro: Terminamos a festa na FNAC do Norteshopping, algo combalidos da noite anterior. Arranco com o "Anda Menina" para testar a voz que está meio perdida algures entre o nariz e o esófago. Mas as palavras continuam a ecoar, não sei porquê. Continuam a fazer-me acreditar em algo que já nem sabia que existia. Com o "Canção da Tua Rua" o gig engata, sem volta atrás. A viagem está prestes a terminar e, ainda no palco, já sinto saudades. Há uns abraços, umas fotos e assinaturas no fim, os Peixe:Avião vêm de Braga para falarmos do disco deles que muito promete. Está o grande Ronaldo com a sua voz de anjo sentado a rir-se do que lhes está a acontecer e eu preparo-me para voltar à estrada com a noite a cair e na memória: dois mil rostos ou um, dois mil rostos ou um, dois mil rostos. Ou um.
Obrigado a todos os que apareceram, e à gente do Porto por me receber sempre de braços abertos. Até já.